terça-feira, 18 de dezembro de 2012

AVIDEZ, UMA ESTÚPIDA ILUSÃO



Correndo se alcança a glória. Oh, estúpida ilusão! Em balde o coração palpita por uma vida impossível. Na velocidade das relações que mais propicia o choque, correr, correr, correr... Ninguém finge esta avidez ou apenas finge. Comprometidos que estão com a causa da grandeza. A frente se lhes turva. A ânsia domina a ação. Exclui o medo. Torna qualquer um impassível. O relógio vai bater e, assim, que tempo tenho para ternura? Nada justifica minha fraqueza. Tenho de chegar aonde quis meu pai, querem meus irmãos. Meus amigos esperam e os vizinhos também. Eu mesmo criei este contexto e não posso falhar. Esta avidez justifica todos os desajustes, os conflitos que tive e é a razão de toda inquietude. Parecer impávido é o grande segredo. Minhas razões anárquicas fundamentam a prática. Ser humilde é uma renúncia ao combate. Afinal, todos os poderosos são nossos inimigos. De outro modo nossa glória não seria poética. Não teria a beleza das lutas do bem contra o mal. E para confirmar meu juízo lembro dos grandes revolucionários. Nelson Mandela “ quando o Poder nega nossa liberdade, não há outro caminho para liberdade senão o Poder.” Conquistemo-lo! Martin Luther King “ O homem que ainda não encontrou uma causa pela qual valha a pena morrer não tem razão para viver.” morramos, então! Os revolucionários falam bonito! Não há como, jovem, não acreditar neles. Depois não. Depois ficamos comedidos e chatos. Vêm as leituras. Vêm as reflexões. George Orwell com aquela história de revolução dos bichos vem nos arrancar o sonho definitivamente. Que Malvadeza! Eu amava, incondicionalmente, a história de Che Guevara. É fascinante imaginar alguém cruzar a América de motocicleta. Mais formidável ainda é lutar pela revolução. Mas perceber que esta, como de resto as demais, eram revoluções de animais e quase sempre sem o charme da alegoria de Orwell. Agora perdi a pressa que tinha. Vejo que alimentei demais um juízo equivocado da realidade. “ A realidade deve ser transformada!” Ora, cale-se, seu barbudo de uma figa! Deixe de bravatar inutilmente. As palavras são bonitas...merecem mesmo sempre uns ensaios existenciais, oh Sartre. Mas as palavras formam um universo; as coisas, outro. No plano das coisas pouco, quase nada, pode ser alterado. Vejam as promessas dos últimos governos! Ninguém realiza a substancial reforma da realidade. Nem direita, nem esquerda, nem aqueles patifes, nem estes calhordas. A realidade só está aberta totalmente para as palavras. O pensador Michel Foucault disse isso em“ As palavras e as Coisas”. Fico pensando, quantos erros teria evitado sem esta terrível avidez. Mas nunca me arrependo do que vivi. Só dos erros mais extravagantes. Alguns eu queria repetir, foram deliciosos. Evitar só os de consequências duradouras. Mas vá! Quem domina o passado? Eu, nem mesmo o presente, acreditem. Mas não me esqueço de pensar nas coisas. Para isso, claro, as palavras. “ as mil faces secretas”. A dor que às vezes não sai facilmente. Tenho saudade da garagem, que era nosso clube literário da adolescência. Dos amigos que estão tão longe. Não diminuímos as injustiças. Não resolvemos os problemas da nação como havíamos prometido. Não conquistamos o Poder ainda. Mas às vezes sou feliz nas coisas cotidianas. Sem a glória da história revolucionária. Sem a avidez ingênua que tinha. Mudei um pouco de mim. Leio um livro. Vejo um filme. Ouço uma canção. A ternura eu resgatei e lembro também de Ferreira Gullar com suas palavras transformadoras. “ E dou adeus às ilusões, mas não à vida, mas não ao mundo...” , mas não a luta. Não sei por que agora esta vontade de chorar. Oh! estúpidas ilusões.

APESAR DE TUDO, MEU BARRO DURO



Apesar de apenas 25% da população adulta brasileira ser plenamente alfabetizada. Apesar de ainda haver no país crianças disputando com urubus pedaços de comida estragada para matar a fome, nos lixões. Apesar de os outros às vezes não acreditar na gente. Apesar de às vezes a gente mesmo não acreditar. É preciso sempre nutrir um pouco de esperança. Apesar da origem humilde, da luta fatídica dos pais para angariar o pão, da desilusão, que às vezes vem à porta e bate e a gente tem de se segurar em algo para não abrir e cear com ela, das tentativas em vão de mudar os outros; É preciso acreditar ainda. Apesar de a maioria não se importar com os rumos da cidade, de habitar uma caverna alegórica, como asseverou Platão, de as leis serem deturpadas e o direito suprimido; de a torcida sincera ser um momento raro, de às vezes o irmão ser o primeiro a ferir, é preciso transcender na vida. Apesar do privilégio dos príncipes e dos medalhões, dos que não precisam de tanto esforço, dos que são alçados as maiores alturas para praticar as maiores baixezas, como ensinou Ayres Britto, dos covardes que criticam quando deviam apoiar, dos oprimidos que se aliam aos poderosos contra os seus iguais, é preciso não se curvar nunca. Apesar do desânimo ser justo, das cercas impedirem o prosseguir e o direito de amar, da vilania gozar de boa reputação, do conhecimento ser negligenciado a todo instante, do desamor imperar como regra, é preciso nunca desistir de fazer as coisas necessárias. Apesar de saber que muitos não vão entender, de que muitos não vão querer, de que muitos vão combater a gente e outros não terão forças para continuar, é necessário persistir. Apesar de a gente hoje ainda ser quase invisível para o mundo, de nossa história ainda não ser muito relevante, de nossos amigos mais ingênuos achar que a gente “está vacilando”; é hora de sair da caverna de sombras e enfrentar a vida. “Embora o pão seja caro e a liberdade pequena” como disse o poeta Maranhense, LUTAR POR UM IDEAL DE JUSTIÇA E FRATERNIDADE sempre vale a pena. A alegria dos pais é impagável. O orgulho dos filhos e irmãos é indescritível. Como o grande mestre Jesus, a gente olhar o trabalho de nossas mãos e ficar satisfeito. A partir desse dia será impossível ficar indiferente, vendo um país que tem apenas 25% de sua população adulta plenamente alfabetizada e que crianças ainda se alimentam do lixo. Apesar de tantos obstáculos que a gente tem de vencer nesta vida, de tanto choro contido, e às vezes de tanta dor no coração...Apesar de tudo, é sempre possível a gente fazer um pouco melhor.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

ANA BEATRIZ



Minha menina, você nasceu em 19 de dezembro de 2011. Depois de você é como diz a canção: “os outros são os outros e só”. Posso até dizer que antes eu já conhecia o amor, uma vez que amo verdadeiramente sua mãe Aline, sua avó Brasilina, seu avó Luís, sua tia Maria e seus tios Manoel, Francisco e Edílson. É verdade que também amo alguns bons amigos e minha terra, quase natal, Barro Duro. Mas nada se compara a você, minha pequena. Fico comovido só de olhar para você. Esta história começou quando o testezinho da farmácia registrou dois tracinhos. Você já estava ali. A barriga de sua mãe em pouco tempo começou a crescer. Nós tínhamos tanto cuidado. Você foi gerada no Maranhão. Mais precisamente na rua do Milho, nº 88, centro, Santa Inês/MA. Você é geneticamente o prolongamento de mim e de Aline. Dos meus gametas e do sopro divino a vida se fez, e isso, minha filha, é algo espetacular e está muito além de qualquer coisa nesta vida. Você nasceu em Teresina, na maternidade Santa Fé, às 7h15min. Fiquei no apartamento esperando-a, não tive coragem de ver o parto. Foram os momentos mais demorados de minha vida. Mas logo você chegou. Tive, sem exagero, a maior emoção de minha vida. O meu bebê comendo os dedinhos e só esperou o peito da mãe chegar, para mostrar que já sabia mamar. O leite materno foi seu único alimento até os seis meses. Depois começaram as sopinhas, um dia carne, um dia frango, um dia peixe, um dia fígado. A primeira colherada sua foi a daquela foto que você está com a boca amarela. Você começou viajar bem cedo, Teresina, Timon, no restaurante da Geane, pausa para o almoço, sua mãe trocava sua fralda e você dava uma demorada mamada, Caxias, Códo, Peritoró, Alto Alegre do Maranhão, Bacabal, Pio XII, Bela Vista e finalmente Santa Inês, onde seu velho trabalha. Era muito tranquila, sorridente e quase não chorava. Demonstrava gostar muito da música que tocava no carro do papai para distrair na viagem. Depois ficou em definitivo em sua terra natal Teresina e só viajando, toda semana, para o nosso Barro Duro e para São Pedro visitar os avós. Vieram os dentes e o sorriso ficou mais lindo e constante. E uma semana antes do primeiro aniversário deu os primeiros passinhos. Nem preciso dizer que sua primeira palavra foi “papa”, é claro que as consoantes bilabiais explosivas ajudam um pouco nessa hora. Eu penso mil coisas para você, mas desejo mesmo do fundo do coração é que seja decente. Não importa se será advogada, médica, bailarina ou escritora. Importa que seja decente, minha filha. Pessoas decentes não desprezam gente humilde, nem se agasalham de qualquer jeito ao lado dos mais fortes. Gente decente estuda com afinco e trabalha com devoção para melhorar a vida dos outros. Não hesite em dizer não quando necessário. Cumpra os pactos que fizer. Reconheça quando errar e mude de rumo. Não acredite se alguém disser que você não é capaz de realizar algo. Não fique vaidosa se realizar coisas importantes. Nunca se envergonhe de sua história. Faça trabalhos voluntários para ajudar sua comunidade. Não esqueça que seu lugar é Barro Duro e que Jesus é seu senhor e seu Deus. “Você é minha semente de tudo, eu vivo a partir de você ”. Feliz aniversário.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

O CACHORRO E O PORCO




Diz-se que era uma vez um homem que tinha dois animais de estima pessoal: um cachorro e um porco. Ao que se sabe o cachorro é o mais solidário dos quadrúpedes da terra. O que já lhe legaria uma reputação de peso. Mas não param por aí suas virtudes. É companheiro. Luta pelo seu senhor, ainda que com manifesto risco próprio. Tem ótimo humor. É o guarda fiel que nunca abandona o seu amigo, mesmo que este esteja fragilizado. Mesmo quando todos se vão. Ter a companhia de um cachorro é ter a certeza de que nunca se ficará sozinho. E ter um amigo de verdade para juntos gozar a vida e eventualmente compartilhar as dores é um luxo inefável. Ninguém, com o senso de prudência ainda no comando, pode prescindir dessa dádiva dos céus para enfrentar os desafios constantes da vida. O cachorro é sempre um amigo verdadeiro. Um amigo verdadeiro é sempre um cão acostumado a nos acompanhar em toda travessia. Seja na luta sem vitória. Seja no choro de um sonho frustrado, que nem sempre se diz covardia. Seja no recomeçar várias vezes. Seja no acreditar que, quando menos, temos um bom amigo para dividir a dureza desses dias. Já ninguém ignora que o porco é um fanfarrão. E que blasona de valente, poderoso e amigo sem o ser. Preocupa-se apenas com sua própria porção. Ainda que de comida suja. Quer estar mordendo o tempo todo, mesmo que na lama. É barulhento. Fétido e covarde. O porco é leviano por natureza. Se a gente sangrar e perder a alegria, ele vai atrás de ração em outras cercanias. Não importa o quanto engordou sob nosso cuidado. É o seu destino suíno. Movido pelo seu instinto pantagruélico, devora tudo que se põe em seu caminho. Diz-se que o homem mantinha os dois animais com a mesma atenção e carinho. Mas o porco não fazia caso dele e só se interessava em tirar algum proveito daquela relação. O homem aprendeu muito com as características daqueles animais e ficou sábio. Percebeu que, não importa o que se faça, o estilo do porco nunca muda e ele nunca vai deixar de ser egoísta e interesseiro. Também já tive muitos amigos desse estilo. Por isso, hoje me resta pouca ração de paciência com essa classe. Agora só dedico tempo para amizade com verdadeiros companheiros. Que sejam leais como os cães. E saibam distinguir bem para que servem os amigos.