sexta-feira, 3 de maio de 2013

METÁFORAS DE UM SERTÃO ENCANTADO



Para d. Socorro

Outro dia disse que a vida, às vezes, é insípida como pedra de toá. Mas esqueci de dizer que, noutras vezes, a mesma vida, apresenta-se saborosa como uma ata rachada colhida no pé. A gente enfrenta a aridez de mil desertos porque acredita na vida. Levanta cedo. Lembra-se do que ama. Faz planos para viver melhor. Livra-se do que pode e vai-se tocando esta toada rudemente. Não é muito sofisticado fazer metáforas de um sertão pobre em que se viveu pesadamente, mas é a memória que tenho, a imaginação que tenho, a sorte que trago. Por isso, falo de anum, urutau, preá, dor de veado. Por isso, o tema frequente da pescaria. As cuncas, o capote e a enfieira. O delito com o timbó. A corrida para chegar no campo cedo. Esta conversa fiada que às vezes tenho comigo mesmo... Esta saudade que não é só minha. A vida é uma colheita de ata madura exatamente quando pessoas como a senhora, cara leitora, apreciam a nossa verdade. Disse que se viu refletida na crônica, bom, pois eu a fiz para senhora. Eu escrevo na esperança de encontrar alguém para ser companheiro neste enternecer. Alguém que possa dizer eu também estive na beira daquele riacho metafórico, mas nunca toquei em outro mais real. Disse que “o leitor está mais presente no texto do que o escritor imagina”. Talvez por isso sempre me imaginei amigo de Manuel Bandeira. Disse que teve um chafariz na infância sertaneja, nossa! Eu banho ainda em pensamento todo dia no meu. A senhora escreve de um jeito honesto. Tem uma dicção refinada. Sei que Mariana tem muito da senhora. Espero deixar semelhante legado para minhas filhas. Este hábito de ver a vida também nos livros acrescenta muito a nossa percepção das coisas. A senhora toca as entrelinhas. Então, como fez o Fascinante Rubem Braga numa crônica, quero terminar do mesmo jeito e dizer: “um aperto de mão dona Socorro.”

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