Uma vez eu peguei uma lambu na arapuca. Foi um dia muito
feliz. Eu só precisava daquilo no meu dia, mais nada. Foi na beira do riacho,
próximo à vereda que dá no pé de pitomba da Santa Maria. Saí veloz para vender
o pássaro, vivo, ao seu Raimundo Elói da Pousada. A venda era certa e o que
fazer com o dinheiro também, comprava dindim de buriti na dona Mundica e comia
com pão da padaria do Chico Bodim. Naquele tempo, eu só usava calção de
elástico, sem camisa. A minha casa ficava na periferia mais longínqua. Morávamos
em uma casa de taipa e chão batido de cepo, coberta de palha de coco babaçu. A
porta da casa era de talo de buriti. Meu prato era uma lata de goiabada vazia, igual
a que o Buti fazia de pandeiro no ponto de ônibus. Água, a gente pegava no
chafariz. Roupa, a gente lavava no açude. Na noite, luz de lamparina. Na rua,
plena escuridão. Não podia imaginar, naquele tempo, que, na península
escandinava, o sol brilhava todo tempo no verão. Que na Noruega a inflação é 2%
ao ano e não existe lá um só analfabeto; que em Oslo a qualidade de vida é
excelente; que o índice de desenvolvimento humano de um país pode chegar a
0,955; que um povo pode ser culturalmente pacífico e que corrupção no governo
não é uma coisa natural. Os governos do Brasil, do Piauí e do Maranhão lutam
constantemente para nos convencer que a miséria e a ignorância são uma
fatalidade nos nossos "tristes trópicos". Eu até poderia acreditar que
não tem jeito, se não existisse a Noruega. Se um operário corrupto não ficasse
milionário, em apenas oito anos no governo. Se ainda fosse ingênuo como em 1985.
Lembro-me de um tempo em que eu precisava de tão pouco para ser feliz. Mas hoje
desconfio até das virgens, quanto mais dessas prostitutas assaz experimentadas
da política do Brasil.
Todos os textos do Doutor José Soares que falam sobre sua infância, fazem-me retroagir no tempo pois, vivi de forma muito semelhante...
ResponderExcluirA falta de uma alimentação balanceada ,essencial ao desenvolvimento de qualquer criança ,o desconforto da casa humilde, a água quente do pote, a falta de um caderno da capa bonita e do sapato de marca...
A falta de tudo isso poderia ser sinônimo de revolta, mágoa e frustração, no entanto, O nosso grande escritor Barrodurense, transforma toda essa “escassez” em uma fonte de poemas e crônicas que fazem, quem viveu a experiência do “pouco” ter “MUITO” orgulho de ter vivido uma história que tinha tudo para ser trágica, mas, nos enche de orgulho pois com todas as dificuldades vivenciadas, algumas mazelas dos tempos modernos não nos atingiram (cito aqui as drogas lícitas e as não lícitas)
Pensem em tempos difíceis...
Mas, acreditem, foi um tempo maravilhoso...
(Noemia )