Vi uma vez a escritora Adélia Prado chorando ao ler um poema
de Carlos Drummond de Andrade. Para um cartesiano comum isso deve ser encarado
como uma cena patética. Todavia, para os artistas e as demais pessoas de
sensibilidade desenvolvida, uma coisa ou um ato deflagram memórias e relações,
e abrem caminhos para os afetos, e deixam a certeza de que nada passa para quem
ama. Lembrei disso, porque na quarta-feira é meu dia de comer chocolate. Gosto
de chocolate. Os flavonoides do cacau são vasodilatadores naturais. Mas não
penso nisso, só como porque é uma delícia gastronômica. Dizem que uma princesa
de Espanha levou chocolate para a corte da França e isso fez com que a iguaria ganhasse
um requinte de realeza. Mas não como chocolate para ser requintado. Em verdade
até prefiro o doce de mamão da dona Brasilina. O fato é que, toda quarta-feira,
como chocolate. Não faço isso mais vezes, porque sempre faço um grande esforço
para não cultivar vício algum nessa vida. Gosto de chocolate, mas gosto mais ainda
de arte. Toda quarta-feira eu e uns amigos artistas fazemos o chá com os
artistas, em Santa Inês, uma reunião semanal em que sempre há música,
literatura, teatro e dança. Quando é quarta-feira, chocolate tem cheiro de
arte. Eu já acordo cedo com esse cheiro e compreendo muito bem por que a poeta
Adélia Prado chorou.
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