Talvez um dia eu diga adeus ao Maranhão, mas não ainda, mas
não agora, mas não já. Eu penso os lugares a partir dos rios, dos riachos e dos
igarapés. É o que mais me fascina na natureza. Aqui tudo é belo neste jaez.
Quando eu terminei a faculdade, vim trabalhar como professor na cidade de Barra
do Corda. Tenho um modo estranho de me apegar aos lugares mais do que às
pessoas. Já se disse que "só é digno de estar em um lugar quem o ama".
Eu amei o rio Corda sem esforço algum. Um menino ribeirinho que trago dentro de
mim precisa de uma correnteza para se deixar levar de corpo e de pensamento. O
Corda e o rio Mearim se abraçam no centro da cidade. A gente pode vê-los seguir
juntos, e perceber que o belo rio Corda já não existe mais quando aquelas águas
chegam a Bacabal. Depois vim para Santa Inês, no Vale do rio Pindaré. Ainda
encantado com a terra, mas tendo também agora que olhar para as gentes. Vê-se
que aqui dá no raso a poesia. Gonçalves Dias, Ferreira Gullar, João do Vale,
Nauro Machado, Raimundo Correia são tantos e fortes e de cantos tão belos que a
graúna negra deixa a serra e vem para o vale me emocionar como um dia fizera
uma linda toada do boi de Axixá. A arte é sublime, mas não apaga a vergonha dos
indicadores sociais do Maranhão. O analfabetismo aqui chega a 56% da população,
isso fora o analfabeto político, que é o que existe de mais estarrecedor. Os
governantes demonstram claramente inclinação para déspotas. Há ainda não sei
que de bruto no Maranhão. É mesmo muito difícil desbravar as almas. Tanto mar,
rio e riacho a nos separar. Mas o tipo humano do Maranhão tem uma beleza
natural. Uma linguagem que dá gosto ouvir. Como disse uma vez Manuel Bandeira o
povo é que fala gostoso o português do Brasil. No Maranhão fala-se bonito
demais. Só um doido poderia achar essa prosa daqui parecida com o falar de um
portuga, seja Manuel, seja Joaquim. Aqui chama-se comida é "comer". Diz-se
para o amigo: "te olhei na feira hoje" ou "mais tarde a gente se
olha". Para compartilhar algo diz-se "eu participei todo o acontecido
para o patrão". Fica-se "arreliado" com a vida dura e xinga-se
"uma misera dessa só pode estar é abilobado". Eu me apego aos lugares
onde vivo. Vejo Santa Inês com um futuro glorioso. Para mim aqui é a cidade da
arte no Maranhão. Um dia canavial e ponta da linha do trem de ferro, hoje o
progresso se avizinha veloz. Tenho ternura por esta terra. Não cheguei
atrasado, uma vez que estou vendo tudo acontecer. E o que não vi os poetas e
músicos me contaram com arte sem igual. Como o mestre Ariano Suassuna, eu
também sou ligado a uma terra de onde vim. O meu lar é encantado, tatuou minha
alma e dele não me posso desvencilhar. Mas agora minha vida é no Maranhão. Sou
feliz aqui. Sei que a gente precisa trabalhar muito por dias melhores. Que seja
o labor de quem ama. Posso um dia dar adeus ao Maranhão, mas não ainda, não
agora, não já.
O escritor nato... Belo texto meu amigo.
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